Caravaggio

Recriação intensa da vida de Michelangelo Merisi da Caravaggio, este filme mergulha no século XVII através dos quadros dramáticos e quase blasfemos que o pintor concebeu. A narrativa acompanha-o desde a genialidade artística até aos excessos — combates, amores proibidos e encontros com o submundo — traçando o percurso de um homem cujo talento convive com a autodestruição. As cenas sugerem tanto os bastidores da criação como a violência do quotidiano, lembrando que a vida do artista era tão teatral quanto as suas composições.

A realização opta por uma estética deliberada e pictórica: composições que remetem a tableaux vivo, jogos extremos de luz e sombra e entradas súbitas de cor que evocam o claro-escuro caravaggesco. Em vez de uma biografia linear, o filme prefere fragmentos, memórias e encenações que fazem os quadros saltarem da tela para o espaço dramático, dissolvendo fronteiras entre realidade e mito. O resultado é uma experiência sensorial onde a fé, a devassidão e a beleza convergem de forma provocadora.

Mais do que uma crónica histórica, a obra é uma meditação sobre criação, escândalo e desejo. Convida o espectador a confrontar a beleza incómoda das pinturas e a ambivalência moral do seu autor, oferecendo um tributo cinematográfico que impressiona tanto pela coragem visual como pela intensidade emocional. No final, permanece a imagem de um génio contraditório, cuja obra continua a interpelar e a desafiar.